sábado, 13 de outubro de 2007

Minha indignação e intolerância, um desabafo

É estranho quando se perde um ente querido. As pessoas têm a falsa impressão de que podem compreender como você se sente, sendo que só saberão,—ainda com a ressalva de que cada pessoa sente de uma forma diferente— se realmente vivenciarem a situação.
Meu pai faleceu em 31/08 deste ano. Já ouvi comentários como “nossa, como você consegue ir trabalhar” ou “se fosse comigo eu ficaria 1 mês em casa”, dentre outros do gênero.
É engraçado porque você sabe que as pessoas não falam por mal, mas ao mesmo tempo me pergunto “por que eu tenho que ouvir comentários como esses, se a dor é minha e não tenho q provar a ninguém como me sinto, muito menos fazer divulgação pública da dor que assola minha família?!”.
Me indigna tal incompreensão, já que às vezes, me pergunto se alguém imagina que só por estarmos respirando e vivendo, ao invés de depressivas e melancólicas trancafiadas em casa, estamos bem, ou até mesmo, ótimas. Minha amiga Jú, que perdeu o irmão há pouco tempo, tem a mesma sensação.
Por outro lado, sei que minha intolerância é resultado de um desgaste emocional enorme, oriundo das semanas de mudanças bruscas na minha vida em um período tão curto.
É por isso que, ao ouvi-las, procuro sempre lembrar que as pessoas se preocupam conosco, e numa tentativa atrapalhada, expressam o cuidado para conosco.
Quando a mãe de uma amiga me disse que a morte de meu pai a ajudou a compreender com clareza o texto bíblico que diz que o fim está próximo, eu também lembrei quão amorosa ela é, apesar de não ter alcance da dor que me causava sua equivocada associação. Afinal, é difícil encontrar algo que não doe nesse momento.

Boa notícia em meio à turbulência

Depois de um processo seletivo de 4 fases, dia 20 de setembro soube que havia sido chamada para estagiar no Estadão. Para mim, e para qualquer estudante de Jornalismo, seria mais do que um sonho iniciado. Mas sabe, primeiro que, subestimando-me, como de costume, demorei um pouco a acreditar. Quando realmente acreditei, comecei a chorar incontrolavelmente porque não parecia ter sentido algum uma conquista como essa sem poder contar para o papai, sem ter meu pai para se orgulhar.
As pessoas sabem, se preocupam, são solícitas e gentis, oferecendo-se para inúmeras coisas, a fim de nos ajudar. Especialmente a mim, que estou morando sozinha novamente. Inclusive, há muitas pessoas para agradecer, pois muitas se ofereceram para nos ajudar e diversos sentidos.
Mas a realidade é que o vazio que há em cada uma de nós três ninguém poderá mensurar, compreender, ou imaginar.
Nunca caí nesse erro, de pensar que imaginava a dor de alguém que sofreu uma perda. Expressão que eu inclusive, nunca usei, pois, até aquele momento, eu desconhecia realmente seu significado.
Se por aqui passar alguém que, por ventura, também dirigiu a mim palavras como as mencionadas no início da narrativa, não se preocupe, nem se ofenda. É apenas o desabafo de alguém que está em busca do equilíbrio.

Eu te amo papai

Arrancaram-me um pedaço.
Deixado foi um espaço fundo, não cicatrizado, que o vazio preenche por inteiro. Quisera eu conhecer os desígnios do todo poderoso destino, pois teria usufruído os últimos momentos, além de cada ínfimo momento/segundo, com mais entrega.
E tempo.
Ele se foi, e a nós restou a dor, e depois, a saudade.
Certas de que o tempo resolverá nossas torturas, procuramos sobreviver à sua inerente presença na casa.
Cada carrinho de mão de areia ou pedra, cada telha colocada, cada parede levantada, cada azulejo ou piso, cada detalhe.
Todos eles se devem à sua enorme dedicação e desejo de agradar e fazer feliz sua família.
Pela manhã da sexta-feira, dia 31 de agosto, ele era um homem saudável e ativo, enquanto à tarde, o pior aconteceria.
Custa muito acreditar que aos 53 anos ele não está mais conosco, deixando tantas lembranças e solidão.
Como entender que ele não mais existe?
Seu chinelo ainda está na porta de vidro, o cafezinho, costumeiramente passado toda tarde também está lá, em cima da pia.
Os óculos para leitura ainda estão em cima da mesa, e a contabilidade do mês a fazer.

Agora somos apenas nós três. Mamãe, Poli e eu. Papai faleceu em 31/08/2007. Ele nem chegou a usar a camisa que demos de Dia dos Pais pra ele, nem comeu os 3 chocolates finos que eu escolhi especialmente pra ele. Queria tanto vê-lo com a camisa.
Redigido em 02/09/2007.